Por FÁBIO DO NASCIMENTO FONSÊCA
(fabionfonseca@gmail.com)
Um dos
resultados da CONAE 2010 (Conferência Nacional de Educação, realizada no ano de
2010) foi a aprovação da realização de conferências similares a cada quatro
anos. Assim, no próximo ano, sob a coordenação do FNE (Fórum Nacional de
Educação), teremos a realização da CONAE 2014, que, em sua fase preparatória,
vem sendo precedida pela realização de conferências municipais e
intermunicipais, a que se seguiram conferências estaduais que culminarão no
evento nacional.
Para 2014,
a CONAE tem como tema: “O PNE NA ARTICULAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO:
Participação Popular, Cooperação Federativa e Regime de Colaboração”. Como
resultados deste processo, espera-se que a mobilização e a discussão a ser
construída coletivamente em todo território nacional contribua para a organização
da educação nacional e a consolidação do novo PNE (Plano Nacional de Educação),
em tramitação no Congresso Nacional. A conferência terá, ainda como focos, a defesa
da construção do Sistema Nacional de Educação (SNE) e na regulamentação do
regime de colaboração entre os entes federados, bem como a proposição de
uma Política Nacional de Educação, a qual deverá indicar as responsabilidades,
corresponsabilidades, atribuições concorrentes, complementares e colaborativas
entre os entes federados e os sistemas de ensino. Nesta direção, o primeiro
eixo a ser trabalhado em todo o processo de preparação da conferência, até a
sua realização em 2014, diz respeito exatamente ao Plano Nacional de Educação e
à criação do Sistema Nacional de Educação, bem como a sua organização e
regulação¹.
Entre os
fundamentos em que se alicerça o processo de discussão a ser construído na
CONAE 2014, está o disposto na Emenda Constitucional 59/2209² que, objetivando
imprimir um caráter unitário à oferta da educação básica no país, estabeleceu
que, na organização dos seus sistemas de ensino, a União, os estados, o
Distrito Federal e os municípios definirão formas de colaboração, de modo a
assegurar a universalização do ensino obrigatório. A mesma Emenda
Constitucional 59/2209 definiu ainda que o PNE, de duração decenal, deverá
constituir-se num instrumento que deve ter como objetivo articular o SNE, em
regime de colaboração entre os entes federados, a partir da definição de
diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação, de modo a
assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis,
etapas e modalidades. Para tanto, O PNE deverá indicar o encaminhamento de
ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas, em
particular o estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em
educação como proporção do produto interno bruto (PIB).
Nos termos do
Documento-Referência (MEC/FNE, 2012) que orienta o processo de mobilização e
discussão em torno da CONAE, o Sistema Nacional de Educação (SNE) é entendido
como expressão institucional do esforço organizado, autônomo e permanente do
Estado e da sociedade, aí compreendidos os sistemas de ensino da União, dos
estados, do Distrito Federal e dos municípios, como também outras instituições
públicas ou privadas de natureza educacional. Assim, o SNE, conforme o
mencionado Documento-Referência,
É concebido como
forma de organização que viabilize o alcance dos fins da educação, em sintonia
com o estatuto constitucional do regime de colaboração entre os sistemas de
ensino (federal, estadual, distrital e municipal), tornando viável o que é
comum às esferas do poder público (União, estados, DF e municípios): a garantia
de acesso à cultura, à educação e à ciência (art. 23, inciso V).
Sabemos
que, nos termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN nº
9.394/96), ao tratar , no Título IV, da organização da Educação Nacional,
estabelece, em seu artigo 8º que “ “A União, os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os respectivos Sistemas de
Ensino”. Para além da simples delegação de competências, a LDBEN sinaliza um
avanço na direção da articulação de uma Política Nacional De Educação, como
proposto no parágrafo primeiro do mencionado artigo, a partir do regime de
colaboração. Caberá a União, articular os diversos níveis e sistemas,
desempenhando funções de natureza normativa, redistributiva e supletiva em
relação às demais instâncias.
Além da
elaboração do Plano Nacional de Educação (PNE), em colaboração com os demais
entes federados, é tarefa da União a prestação de assistência técnica e
financeira a Estados, Distrito Federal e Municípios, bem como, juntamente com
os mesmos, Estabelecer competências e diretrizes para a educação Infantil, o
ensino fundamental e o ensino médio (e educação profissional, em regime de
articulação) (incisos I, II, II e IV do artigo 9º da LDBEN).
No
tocante aos Municípios, a LDBEN, em seu artigo 11º, estabelece como
incumbências:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e
instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e
planos educacionais da União e dos Estados;
II - exercer ação redistributiva em relação às suas
escolas;
III - baixar normas complementares para o seu
sistema de ensino;
IV - autorizar, credenciar e supervisionar os
estabelecimentos do seu sistema de ensino;
V - oferecer a educação infantil em creches e
pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em
outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as
necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais
mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do
ensino.
Ressalte-se que, de acordo com o parágrafo único do mesmo
artigo 11º da LDBEN, os municípios têm a prerrogativa de constituir seus próprios sistemas de ensino
ou permanecerem integrados aos sistemas estaduais ou ainda comporem com os
mesmos um sistema único de educação
básica.
Aqui cabe uma reflexão particular, considerando o
fato de que, nos últimos anos, os municípios têm, progressivamente, assumido
uma responsabilidade cada vez maior na oferta da educação básica, especialmente
nos níveis da educação infantil e ensino fundamental (aí incluídas também as
modalidades da educação especial e da educação de jovens e adultos), sem, ainda
uma correspondente contrapartida na redistribuição de recursos, mesmo
considerando-se os avanços alcançados com a instituição do FUNDEF (Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) e
sua posterior substituição pelo FUNDEB (Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais
da Educação). Isto se observa de modo ainda mais evidente em regiões
como Norte e Nordeste, onde as condições econômicas e sociais acabam por
responder também pela permanência da precariedade na oferta do ensino público
no âmbito dos municípios, traduzida em índices de qualidade mais baixos nestas
regiões.
Neste
contexto, especialmente nos municípios destas regiões, o processo de construção
da CONAE 2014 representa uma oportunidade para a mobilização de setores
organizados, no sentido de construir estratégias e articulação de forças
para garantir o cumprimento efetivo do dever do Estado na garantia de uma
educação básica pública e de qualidade efetivamente para todos. O
esforço na direção da construção ou consolidação dos sistemas municipais de
educação deve incluir a consideração das necessidades, especificidades e
carências próprias destes municípios, indicando tanto os compromissos que devem
e precisam assumir quanto a chamada de responsabilidade dos demais entes
federativos naquilo que lhes cabe.
Assim,
ao encaminharem os debates e encaminhamentos em seus encontros e conferências
municipais, estes municípios devem tomar, como ponto de partida, questões que
traduzam a particularidade das demandas e exigências que envolvem a oferta da
educação básica com qualidade para todos. Nesta direção, é importante suscitar
a discussão em torno de questões como:
} Como, a partir das demandas do contexto local,
construir um sistema municipal de ensino, articulado ao sistema estadual e
nacional?
} Nesta perspectiva, que desafios tem o município a
enfrentar, na construção do seu Sistema municipal de Ensino e na definição de
políticas locais para a Educação, em articulação com a construção do Sistema
Nacional de Educação e com o PNE?
} Em face de suas necessidades e especificidades, que
prioridades, objetivos e metas podem ser indicados, como respostas a estes
desafios?
} Que iniciativas e tarefas podem ser apontados como
encaminhamento destas prioridades, objetivos e metas?
} Como nestas iniciativas e tarefas, se inscreve a
responsabilidade do município e de que forma podem envolver a colaboração do
Estado e da União?
REFERÊNCIAS:
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. FÓRUM NACIONAL DE EDUCAÇÃO. CONAE 2014 – Documento-Referência.
Brasília: MEC/FNE, 2012.
NOTAS:
(1)
Emenda Constitucional 59/2209, entre outras
alterações, dá nova redação aos incisos I e VII do art.
208, de forma a prever a obrigatoriedade do ensino de quatro a dezessete anos e
ampliar a abrangência dos programas suplementares para todas as etapas da
educação básica.
(2)
Além
do Eixo I, que envolve a discussão em torno do Plano Nacional de Educação e do
Sistema Nacional de Educação e sua organização e regulação, a CONAE 2014 terá
como pauta os seguintes outros eixos: Eixo II – Educação e Diversidade: justiça
social, inclusão e direitos humanos; Eixo III – Educação, Trabalho e
Desenvolvimento Sustentável: cultura, ciência, tecnologia, saúde, meio ambiente;
Eixo IV – Qualidade da Educação: democratização do acesso, permanência,
avaliação, condições de participação e aprendizagem; Eixo V – Gestão
Democrática, Participação Popular e Controle Social; Eixo VI – Valorização dos
Profissionais da Educação: formação, remuneração, carreira e condições de
trabalho;.Eixo VII – Financiamento da Educação: gestão, transparência e
controle social dos recursos.